A Sargento* Priscila Diana vê no seu senso de justiça e na influência familiar os principais motivos que a levaram a escolher a profissão. Policial Militar há 22 anos, ela coleciona elogios em ficha e medalhas de mérito, e atribuí à corporação um papel fundamental na sua transição de gênero.
Na ocasião do aniversário de 185 anos da PMSC (Polícia Militar de Santa Catarina), comemorados nesta segunda-feira (4), o nd+ conversou com a primeira mulher trans a ocupar um cargo na corporação. A Sargento Diana, seu “nome de guerra”, trabalha no Planalto Norte catarinense.
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“Amo o que faço. Já arrisquei a vida várias vezes, já ajudei a salvar várias pessoas, vi muita coisa e passei por muita coisa. Mas não me imagino em outra profissão” conta a policial, que nunca teve uma punição em ficha.
A carreira de Diana começou aos 19 anos, quando passou em concurso público. De soldado, hoje ela ocupa o posto de terceira sargento. Diana foi uma das primeiras policiais em grupo tático da região do Planalto Norte. “Fiz vários cursos, inclusive cursos que são muito difíceis e respeitados. Por esses fatores tenho grande respeito da tropa”.
Apesar de sempre atuar na área operacional, como comandante de policiamento, hoje a Sargento trabalha na reserva de armamentos da PMSC. Lá ela realiza o controle, a distribuição e manutenção de armas e equipamentos policiais.
Transição de gênero
Diana começou sua transição de gênero de forma gradativa, aos 29 anos, após uma década de atuação na Polícia Militar. Aos poucos, ela foi realizando os procedimentos de hormonização e as cirurgias de feminização facial.
“Comecei minha transição por conta própria, com pouca informação. Naquela época era basicamente a aplicação de hormônios sem receita médica. Depois de anos que comecei acompanhamento médico e psicológico específico para pessoas transgêneros” afirma Diana.
Naqueles idos de 2009, quando ela começou sua transição, a legislação que reconhecia a população transgênera era ainda muito incipiente. Apenas nove anos depois que o nome social pode ser utilizado nos serviços públicos de Santa Catarina e no título de eleitor, por exemplo.
Diana, que briga com o mundo
Primeiro ela solicitou o direito de usar o nome social, baseado nos decretos federal e estadual. Porém, antes de sair a resposta do pedido, Diana conseguiu retificar legalmente todos os documentos (certidão de nascimento, identidade, CPF, título de eleitor, CNH, entre outros).
Com a permissão para a retificação do nome social, veio então o momento de decidir qual seria o seu novo nome. A Sargento já tinha decido que se chamaria Priscila. Mas após conversar com uma amiga, decidiu que incluiria também Diana, em referência a Diana Prince, a Mulher-Maravilha.
“Ela [a amiga] me disse, em tom de brincadeira, por que não coloca Diana, já que vai ter que brigar com o mundo? Então entrei na brincadeira e falei: sabe de uma coisa, vou colocar então junto Diana. E então ficou Priscila Diana” lembra a Sargento.
Apoio da corporação
Apesar de todo o trâmite burocrático ter corrido sem maiores problemas, o processo de transição foi acompanhado pela insegurança diante da recepção dos colegas de profissão, com quem já cultivava uma amizade sólida. “Não sabia como seria a reação deles”, lembra a sargento.
Entretanto, a recepção a surpreendeu. Para conscientizar os policias sobre as formas corretas de tratamento e sobre a realidade de Priscila Diana, a PMSC preparou a tropa. Durante a sua transição, foram realizadas palestras ministradas por doutores em sexualidade e gênero, lembra a Sargento.
Os colegas também a mandaram mensagens de apoio. “Já houve casos de tratamento no masculino, mas foram raros. Logo a pessoa percebeu e corrigiu. Afinal também é uma questão de costume”, conta. O respeito também veio dos seus superiores. “Atuo em frentes representando a Polícia Militar tanto dentro como fora. Me impor nunca foi necessário”.
Sua esperança é que as pessoas passem a entender a transexualidade não como uma mera ideologia, mas sim como algo que tem embasamento científico e estudos.
“Gostaria de pedir mais empatia, que não julguem sem conhecer a história de cada pessoa”. É uma disforia que você não tem culpa e nem escolhe. Afinal quem escolheria passar por tudo que passamos? não tem como uma pessoa trans ainda se sentir cem por cento acolhida em toda a sociedade em geral”, completa.
*Com exceção do cargo de capitã, as Forças Armadas não adotam as formas femininas para nomear seus postos. É o artigo que marca a diferenciação de gênero. Por exemplo: “a tenente”, “a coronel”, “a cabo”, etc.
Informações ND+